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O Papel do Nefrologista na Injuria Renal Aguda, Além do Suporte Renal Artificial.

Atualizado: 1 de set.

Por Jose de Jesus Lascano Contreras e Rhuan de Moura Severo


Introdução


A nefrologia tem historicamente desempenhado um papel fundamental no manejo da injuria renal aguda (IRA) e a doença renal crônica (DRC), especialmente no suporte dialítico. No entanto, diante de desafios como a superlotação do Sistema Único de Saúde (SUS) e a limitação de especialistas em procedimentos intervencionistas, surge a necessidade de ampliar a atuação do nefrologista em cenários onde a intervenção precoce pode melhorar desfechos clínicos.


Este relato de caso destaca a importância da nefrostomia percutânea como um procedimento que poderia ser incorporado à prática nefrológica, contribuindo para otimizar o fluxo de pacientes e reduzir a dependência de unidades especializadas superlotadas.


Relato de Caso


Paciente do sexo feminino, 63 anos, hipertensa desde os 45 anos, em uso irregular de medicações, e tabagista com carga tabágica de 50 anos-maço, foi admitida em 29 de dezembro de 2024 em um hospital da região com quadro de perda ponderal importante, prostração e inapetência há mais de três meses, evoluindo com redução acentuada do volume urinário na última semana, náuseas e vômitos.


No exame inicial, apresentava-se hipotensa, torporosa, desidratada e com sinais de má perfusão periférica. Exames laboratoriais evidenciaram infecção urinária, injúria renal aguda (IRA) KDIGO 3, acidose metabólica sem hiperpotassemia (detalhamento laboratorial na tabela 1).


Foi iniciada cobertura antibiótica, expansão volêmica com solução bicarbonatada e realizada sondagem vesical de demora, apresentando diurese <200 ml em 24 horas. Em 30 de dezembro de 2024, realizou novos exames que mostraram progressão da IRA e persistência da acidose metabólica, levando à transferência para a unidade de terapia intensiva (UTI), onde iniciou suporte renal artificial do tipo hemodiálise prolongada.




Tabela 1

Data

29/12/2024

30/12/2024

31/12/2024

Cr (mg/dl)

6.0

7.0

3.2 pós HD

Ureia (mg/dl)

189

210

78 pós HD

Bicarbonato (meq/L)

11

9

18 pós HD

Potássio (meq/L)

4.3

4.9

3.6 pós HD

A tomografia de abdome sem contraste revelou hidronefrose acentuada no rim direito, rim esquerdo atrófico, bexiga espessada e achados compatíveis com neoplasia vesical. Devido à indisponibilidade de hemodiálise na enfermaria, a paciente foi transferida para nosso hospital em 13 de janeiro de 2025, para continuidade do programa de hemodiálise e início do acompanhamento oncológico.


Na nossa avaliação inicial, foi solicitado parecer urológico emergencial para derivação urinária percutânea. Contudo, o procedimento não estava disponível em nosso hospital, o que exigiu o cadastramento da paciente na central de regulação (Gerint). Enquanto aguardava, foi realizada biópsia da bexiga, que confirmou o diagnóstico de carcinoma urotelial (células transicionais) infiltrante. A paciente permaneceu internada em regime de hemodiálise convencional.


Devido à demora na regulação, propusemos à direção hospitalar a realização de nefrostomia percutânea pela equipe de Nefrologia. Após aprovação e aquisição do material necessário, foi disponibilizada uma sala com fluoroscopia, permitindo a realização do procedimento em 6 de março de 2025. Durante a intervenção, foi implantado um cateter Pigtail 10F no rim direito, com punção guiada por ultrassonografia e fluoroscopia para garantir a correta localização do cateter.


A intervenção transcorreu sem intercorrências, demonstrando a segurança e precisão da técnica empregada. O cateter foi posicionado corretamente, e a resposta clínica foi excelente, com a paciente apresentando diurese imediata (ver Tabela 2 e fotos).







Tabela 2

Data

05/03/2025

06/03/2025

07/03/2025

09/03/2025

10/03/2025

Cr (mg/dl)

3,1 (última HD)

(Pós OP)

2,18

0,68

0,7

Ureia (mg/dl)

60 (última HD)

(Pós OP)

52

30

32 

Diurese 24h

50mL

5,5L (Pós OP)

5,5L (Pós OP)

2,9L

5,5L




A paciente manteve excelente diurese e não precisou de novas sessões de hemodiálise após intervenção, retirou cateter de curta permanência para hemodiálise em 11/03/2025 e nesse mesmo dia recebeu alta hospitalar, segue com nefrostomia funcional e aguarda início de quimioterapia em regime ambulatorial.


Discussão e Conclusão


Este caso exemplifica a realidade enfrentada pelo SUS, onde a limitação de especialistas para procedimentos intervencionistas, como a nefrostomia percutânea, leva à internação prolongada de pacientes que poderiam ter alta mais precoce.


O nefrologista, profissional com expertise no manejo ultrassonográfico das vias urinárias e técnica de punção guiada, já realiza procedimentos invasivos como biópsia renal percutânea e inserção de cateteres para diálise. Considerando essa experiência, a incorporação da nefrostomia percutânea à prática nefrológica poderia representar um avanço importante na assistência, reduzindo o tempo de internação e melhorando o prognóstico dos pacientes com obstrução urinária aguda.


Diante desse cenário, propomos a discussão sobre capacitação formal e regulamentação para que nefrologistas possam realizar nefrostomia percutânea em centros onde o acesso à Urologia ou Radiologia Intervencionista é limitado, garantindo um tratamento mais ágil e eficiente para os pacientes do SUS.


Bibliografia:


1. Dagli, M., & Ramchandani, P. (2011). Percutaneous Nephrostomy: Technical Aspects and Indications. Semin Intervent Radiol, 28(4), 424–437. https://doi.org/10.1055/s-0031-1296085.

2. Ramchandani, P., Cardella, J. F., Grassi, C. J., et al. (2003). Quality improvement guidelines for percutaneous nephrostomy. Journal of Vascular and Interventional Radiology, 14(9 Pt 2), S277–S281. https://doi.org/10.1097/01.RVI.0000094605.95419.51.

3. Farrell, T. A., & Hicks, M. E. (1997). A review of radiologically guided percutaneous nephrostomies in 303 patients. Journal of Vascular and Interventional Radiology, 8(5), 769–774. https://doi.org/10.1016/S1051-0443(97)70537-3.

4. Preminger, G. M., Tiselius, H. G., Assimos, D. G., et al. (2007). EAU/AUA Nephrolithiasis Guideline Panel: 2007 guideline for the management of ureteral calculi. Journal of Urology, 178(6), 2418–2434. https://doi.org/10.1016/j.juro.2007.09.107.

5. Sampaio, F. J., Zanier, J. F., Aragão, A. H., & Favorito, L. A. (1992). Intrarenal access: 3-dimensional anatomical study. Journal of Urology, 148(6), 1769–1773. https://doi.org/10.1016/S0022-5347(17)37048-9.


 
 
 

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